sábado, 30 de agosto de 2014

Ubatuba neste sábado...

Com o devido consentimento, foto feita pela ex-aluna e amiga Leidiane Oliveira

"Mesmo cinza, Ubatuba é linda"
Leidiane Oliveira

2ª foto do dia
Leidiane de Oliveira


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Insone


Muitíssimo parecida com a nossa varanda...

Passa da meia noite. Isso mesmo, dia 30 de agosto,aos 18 minutos. Não costumo estar acordada a esta hora, muito menos vir para o computador.
Acontecem coisas estranhíssimas comigo.
Estava assistindo à TV quando pouco depois das 22 horas apagou tudo. Demorou uns 10 minutos e a luz voltou. Mas voltou só em uma fase - nos quartos, na cozinha e banheiro da suíte. Continuam sem luz a entrada de carro, a sala, o lavabo e o corredor. Verifiquei na rua, nas casas vizinhas, nada aconteceu...foi só aqui em casa mesmo. A televisão maior fica na sala, a outra do quarto (onde fica também o computador) está sem imagem, então eis-me aqui, sem sono, sem vontade de ler, aguardando não sei o quê. Acho que a 'coisa' não se resolve hoje não...

Fiquei um bom tempo sentada no sofá, olhando para o nada com o pensamento em várias coisas ao mesmo tempo. No presente (o que será que houve? e o segundo decorrido já é passado), no passado oficial (melhor esquecer) e no futuro (nem sei se vale a pena pensar em futuro). Mas eu pensava... quando me dei conta de que poderia vir escrever.
**
Alterei hoje à tarde a foto do meu perfil e a capa da linha do tempo no facebook; dei uma passadinha por lá e verifiquei que algumas pessoas viram as alterações, sem comentar (ainda bem). Aliás, não tem nada mesmo a ser comentado. No perfil coloquei o recorte de uma foto mais recente feita numa reunião familiar em junho e na capa uma janela abrindo para o mar. Nada demais. As bobagens de sempre do face.


Lembro-me agora de que uma amiga recentemente comentou que não tem entrado no facebook porque, segundo ela, aquilo só serve pra fazer a gente perder tempo.
Eu não penso assim. Gosto da convivência virtual, mesmo porque o que não me falta é tempo. Além disso, vivo um pouco isolada - praticamente a semana inteira.  Filhas e netos têm suas vidas, seus compromissos durante a semana e cada um faz sua parte. Aos fins de semana costumamos nos ver e às vezes saímos para um passeio, um almoço, um jantar, o que é sempre muito bom.

Quanto a mim, vou vivendo sem muitas expectativas ou projetos (no momento não tenho mesmo nenhum), cuidando da minha casa, lendo, assistindo TV (pouco, porque não gosto tanto assim) e tentando reinventar os dias.
Não fico aborrecida  não. Pelo contrário, sou muito agradecida em poder envelhecer num ritmo calmo, relativamente confortável materialmente, presenciando minha família se desenvolver, as crianças crescendo e se situando, enfim, não é pouca coisa neste mundo tão conturbado e com pessoas passando por inúmeros problemas graves. Sinto-me mesmo até privilegiada.

Penso às vezes que eu deveria procurar algo produtivo para fazer, mas ainda não encontrei uma solução que me agrade.

As muitas coisas que eu fazia e com as quais me envolvia não mais me interessam nem atraem. A maturidade tem isso: vem-nos a compreensão do que realmente nos preenche e não somos mais levados por falsas sensações de necessidade disso ou daquilo.

Publiquei no face uma quadrinha de Mário Quintana que traduz de maneira  poética e apropriada o que acabo de dizer:

"Meu saco de ilusões, bem cheio tive-o.
Com ele ia subindo a ladeira da vida 
        e, no entretanto, após cada ilusão perdida...
que extraordinária sensação de alívio."

Ah, Quintana, seus versos calam tão fundo...  Sem falar que apenas os grandes poetas são capazes de rimas preciosas assim: "tive-o / alívio" .  Maravilhoso.
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Voltei para publicar um post não muito educado mas cujas palavras, às vezes, a gente gostaria de falar:


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quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Filme da tarde - "Apocalypse Now"


"O horror, o horror". O contraste barroco do rosto de Marlon Brando surgindo das sombras, as mãos secando o suor, a mata fechada, o rio que serpenteia continente adentro, o xamã, a loucura.  Apocalypse Now, o clássico de Francis Ford Coppola, ao som de Jim Morrison e das Valquírias de Wagner, foi inspirado no livro O Coração das Trevas (1902) de Joseph Conrad, o escritor aventureiro enfiado nos cafundós do Congo Belga.

No livro, Kurtz é um caçador de marfim perdido na África, adaptado para o cinema como o coronel no profundo Vietnã, ou Camboja. 
Da terra sem lei para a lei da guerra, a história mistura aventura e loucura no perigo do desconhecido. Com cenários diferentes, atmosfera parecida, o enredo nos leva de barco por trechos alagados da sanidade, um labirinto psicológico cheio de armadilhas e peças pregadas. 
Cabeças fincadas em lanças, selvagens convertidos ao devaneio, vislumbres do ocaso, lusco-fusco.


Conrad foi mesmo capitão de um barco mercante no Congo Belga ao final do século XIX. 
Fugindo do suicídio, após tentativa frustrada, embarcou rumo ao fim do mundo, rio acima na África selvagem. Empunhou o leme, tateou os cenários do livro, sofreu na pele os perrengues da vida e as picadas dos mosquitos. Quase morreu, colecionando malárias. 
Quando voltou, imortalizou-se escrevendo o pequeno livro que um dia arrebataria Coppola.
*
Texto da página Isso compensa (facebook). Não consta a autoria.
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Só agora, agora neste estágio da vida  tive coragem de assistir a esse filme duro, difícil, denso, carregado de emoções que vão além da matança e cenas de 'ação' a que todo filme sobre guerra se propõe. Na verdade é um filme anti-guerra mostrando toda a insanidade do ser humano em criar o pesadelo de uma guerra. Seja qual for, onde for.

Nasci no pós-guerra - 2ª  Guerra Mundial - cresci ouvindo e lendo sobre guerras e isso não para.

Apocalypse Now, para mim, é uma louca viagem para se tentar entender (sem sucesso) o pensamento, a alma humana e suas contradições. Continuamos sem respostas.
Chorei, chorei e várias vezes fechei os olhos. Não quis, porém, tapar os ouvidos porque os diálogos feriam de tal modo como se deles pudesse ser  expurgada a podridão moral.
Estou aqui atrapalhada e não sei o real significado de ter assistido isso. Uma doideira, um delírio talvez?! E me deixou mal.

É um filme dirigido por Francis Ford Coppola, em 1979, uma adaptação do livro 'Heart of Darkness', de Joseph Conrad ( 1847-1924) autor nascido na Ucrânia mas com cidadania britânica.

No elenco, Marlon Brando, Robert Duvall e Martin Sheen.

Em termos de enredo, narra a história do Capitão Willard, (Martin Sheen) enviado ao Vietnã com a missão de matar o Coronel Walter Kurtz (Marlon Brando), também do exército americano, um oficial respeitadíssimo, com inúmeras condecorações mas que parece ter 'enlouquecido' e está cometendo atrocidades, juntamente com seus comandados, infringindo todas as regras de combate. Age como senhor absoluto tomando decisões sem amparo nos códigos de guerra. Para isso, Willard e seus soldados precisam subir um longo rio em um barco. 
Ali eles passam a se conhecer, cada um a si mesmo e falam entre eles de seus planos, seus desejos, suas metas para quando acabar a guerra.

São cenas inacreditáveis e uma trilha sonora arrepiante. Há um momento em que a tropa do Coronel Kurtz arrasa um povoado vietnamita atirando de helicópteros equipados com um sistema de som tocando a  'Cavalgada das Walquírias', de Richard Wagner. Uma das loucuras do oficial que chama isso de 'guerra psicológica'. 


As falas, como já disse, são primorosas e através delas é lançada a dúvida se realmente Kurtz enlouqueceu ou se chegou à compreensão total de tudo o que realmente somos. Do que somos capazes.  Em certos momentos ele analisa com profunda admiração a coragem do povo invadido, sua dignidade em recusar ajuda, seu orgulho em tentar defender seu país.


Enquanto assistia, anotei algumas frases:

"O exército ensina nossos jovens a matar e soltar bombas, mas os comandantes não permitem que se escrevam palavrões  nos aviões porque é obsceno."

"Como você chama assassinos que acusam assassinos?"

"Você não tem o direito de me julgar. Tem o direito de me matar, mas não de me julgar."

"Eu assisti uma lesma rastejar pela lâmina de uma navalha e sobreviver. Esse é meu sonho. Rastejar pela lâmina de uma navalha e sobreviver."

"No coração de todo homem há um conflito entre o racional e o irracional, entre o bem e o mal e nem sempre é o bem que sai vencedor."

"Um dia esta guerra vai acabar. Para os garotos do barco, está bom. Eles não querem nada mais do que encontrar um caminho para casa. O problema é que eu já voltei e sei que aquele lugar não existe mais."

Ai, meu Deus, um filme longo, forte e que me fez pensar tanto... Só consigo repetir com Marlon Brando, aliás, Coronel Walter Kurtz:

"O horror, o horror..."


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Notinha: 
Não sei por que apareceu esse fundo branco na primeira e segunda partes do texto. Também já tentei arrumar e não deu certo. Devo ter feito algo errado sem querer...

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

" O pianista" - da história real, W. SZPILMAN

Władysław Szpilman 
(Sosnowiec, 5 de Dezembro de 1911 — Varsóvia, 6 de Julho de 2000) 

Nascido numa família judaica, trabalhou em Varsóvia como pianista para a rádio polonesa (onde conheceu uma cantora e o seu marido ator) até a invasão da Polônia pela Alemanha em 1939.

Com a Alemanha Nazista estabelecendo o gueto de Varsóvia, ele foi forçado a instalar-se ali com a família, tal como todos os que eram de ascendência judaica. 
Continuou a trabalhar ali, como pianista, num restaurante. 

Com ajuda do casal amigo, permaneceu no gueto até a população judaica do mesmo ser conduzida aos campos de concentração, quando então foi para dois outros esconderijos após o local ter sido descoberto. Após o amenizar da guerra, escondeu-se em prédios abandonados. 

Em 1945, pouco depois do fim da guerra, escreveu um relato da sua sobrevivência em Varsóvia.

O livro foi publicado na Polônia, com o título Śmierć Miasta, «Morte de uma Cidade», fortemente censurado pelas autoridades comunistas, descontentes com a sua perspectiva da guerra, e o número de cópias impressas foi reduzido.

As memórias de Szpilman não foram reimpressas senão cinquenta anos depois, em 1998, ano em que foram publicadas em inglês (e muitas outras línguas) com o título "O Pianista", obtendo repercussão mundial.

Em 2002 foi produzido um filme baseado na mesma obra, também de nome "O Pianista", pelo realizador Roman Polanski, com Adrien Brody interpretando Szpilman, papel que lhe rendeu o Oscar para Melhor Ator Principal naquele ano. 

Após a guerra, Szpilman prosseguiu a sua carreira musical, tornando-se um dos mais produtivos compositores poloneses.


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Fonte: Wikipédia

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Repouso,' nostalgie', tecnologia, aprendizado

Noossa!
Estou 'dando um tempo', de repouso porque peguei um resfriado fortíssimo. Há dois dias estava bem pior. Ainda estou com dores no corpo, mas está melhorando. Não fiz nada, de nada.
 Hoje, me sentindo melhor, vim para o computador e a internet sempre me surpreende (hahaha). Encontrei uma preciosidade - ou algumas preciosidades - e aprendi muito.

Quando adolescente, assisti aos filmes sobre Sissi, a Imperatriz da Áustria, filmes lindos, românticos com a igualmente linda Romy Schneider.

Assisti também à maravilhosa história da cigana Esmeralda e o disforme Quasímodo em "O Corcunda de Notre-Dame", baseado em romance de Victor Hugo - que também li ainda muito jovem.
Mais tarde, foi montado um musical - "Notre-Dame de Paris" com a mesma história e uma das músicas de que gosto muito é "Belle", na verdade um poema de exaltação e desespero ante a beleza da cigana.

Pois bem, encontrei no canal youtube uma montagem de cenas do filme "Sissi, a Imperatriz", com a música "Belle", composta para o musical "Notre-Dame de Paris".  Uma coisa nada tem a ver com a outra, mas a música coube direitinho na bem feita escolha das cenas. Adorei.
Não é muito louco isso?

E ficou maravilhosa" Olha aí:



Depois, fui então procurar um vídeo do musical "Notre-Dame de Paris" e... encontrei ! (Ah, como é bom ter tempo, ainda mais quando a gente está doentinha... hahaha!!)

Achei lindo também.

 

Belle

( Quasimodo )

C'est un mot qu'on dirait inventé pour elle 
Quand elle danse et qu'elle met son corps à jour, tel 
Un oiseau qui étend ses ailes pour s'envoler 
Alors je sens l'enfer s'ouvrir sous mes pieds
J'ai posé mes yeux sous sa robe de gitane 
A quoi me sert encore de prier en Notre-Dame 
Quel 
Est celui qui lui jettera la première pierre 
Celui-là ne mérite pas d'être sur terre
O Lucifer ! 
Oh ! Laisse-moi rien qu'une fois 
Glisser mes doigts dans les cheveux d'Esméralda

( Frollo )

Belle 
Est-ce le diable qui s'est incarné en elle 
Pour détourner mes yeux du Dieu éternel 
Qui a mis dans mon être ce désir charnel 
Pour m'empêcher de regarder vers le Ciel
Elle porte en elle le péché originel 
La désirer fait-il de moi un criminel 
Celle 
Qu'on prenait pour une fille de joie une fille de rien 
Semble soudain porter la croix du genre humain
O Notre-Dame ! 
Oh ! laisse-moi rien qu'une fois 
Pousser la porte du jardin d'Esméralda

( Phoebus )

Belle 
Malgré ses grands yeux noirs qui vous ensorcellent 
La demoiselle serait-elle encore pucelle ? 
Quand ses mouvements me font voir monts et merveilles 
Sous son jupon aux couleurs de l'arc-en-ciel
Ma dulcinée laissez-moi vous être infidèle 
Avant de vous avoir mené jusqu'à l'autel 
Quel 
Est l'homme qui détournerait son regard d'elle 
Sous peine d'être changé en statue de sel
O Fleur-de-Lys, 
Je ne suis pas homme de foi 
J'irai cueillir la fleur d'amour d'Esméralda

( Quasimodo, Frollo et Phoebus )

J'ai posé mes yeux sous sa robe de gitane 
A quoi me sert encore de prier  en Notre-Dame 
Quel 
Est celui qui lui jettera la première pierre 
Celui-là ne mérite pas d'être sur terre
O Lucifer ! 
Oh ! laisse-moi rien qu'une fois 
Glisser mes doigts dans les cheveux d'Esméralda
Esméralda


Repetindo um velhíssimo provérbio : "Quem tem tempo, faz colher de pau e borda o cabo."


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segunda-feira, 11 de agosto de 2014

NEY MATOGROSSO - Oração (Dani Clark)

Para uma boa semana...

Oração
Composição: Dani Clark

Peço aos céus para me proteger
E eu não hei de ceder
Ao vazio desses dias iguais
Mal em mim nunca há de fincar
Mel em mim nunca há de findar
Olhos nus e atento aos sinais
Faço fé pra poder ver
A vida há de ser sempre mais
Peço aos céus para me defender
De engolir o sofrer
Contato vir a ter jamais
Com o invisível que paira no ar
Dos que querem ver sangrar
Ilumine, e que sigam em paz
Faço fé pra poder ver
A vida há de ser sempre mais
Se acaso a peste
A tempestade trouxer
Que ao se aproximar de mim, suma
Que no seu lugar
Nunca demore a brotar
A celeste semente do amor
Envolto por espirais
Num manto de azul-lilás
Conserve meus bens vitais e calor
Cuide para crescer
E enfim florescer a flor de cristal
Sobre nossos quintais

*    *    *

domingo, 10 de agosto de 2014

Homenagem


Carta
Carlos Drummond de Andrade

Há muito tempo, sim, que não te escrevo.
Ficaram velhas todas as notícias.
Eu mesmo envelheci: Olha em relevo,
estes sinais em mim, não das carícias

(tão leves) que fazias no meu rosto:
são golpes, são espinhos, são lembranças
da vida a teu menino, que ao sol-posto
perde a sabedoria das crianças.

A falta que me fazes não é tanto
à hora de dormir, quando dizias
"Deus te abençoe", e a noite abria em sonho.

É quando, ao despertar, revejo a um canto
a noite acumulada de meus dias,
e sinto que estou vivo, e que não sonho.

*        *        *

In:  'Lição de coisas'

DRUMMOND


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sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Do Jornal 'Folha de S.Paulo' - Marion Strecker

O futuro era lindo  
Marion Strecker  (*) , em 29 de julho 2014

 A informação seria livre. 
Todo o saber do mundo seria compartilhado, bem como a música, o cinema, a literatura e a ciência. 
O custo seria zero. 
O espaço seria infinito. 
A velocidade, estonteante. 
A solidariedade e a colaboração seriam os valores supremos. 
A criatividade, o único poder verdadeiro. 
O bem triunfaria sobre os males do capitalismo. 
O sistema de representação se tornaria obsoleto. 
Todos os seres humanos teriam oportunidades iguais em qualquer lugar do planeta. 
Todos seriam empreendedores e inventivos. 
Todos poderiam se expressar livremente. 
Censura, nunca mais. 
As fronteiras deixariam de existir. 
As distâncias se tornariam irrelevantes. 
O inimaginável seria possível. 
O sonho, qualquer sonho, poderia se tornar realidade.

Livre, grátis, inovador, coletivo, palavras-chave do novo mundo que a internet inaugurou. 
Por anos esquecemos que a internet foi uma invenção militar, criada para manter o poder de quem já o tinha. 
Por anos fingimos que transformar produtos físicos em produtos virtuais era algo ecologicamente correto, esquecendo que a fabricação de computadores e celulares, com a obsolescência embutida em seu DNA, demandam o consumo de quantidades vexatórias de combustíveis fósseis, de produtos químicos e de água, sem falar no volume assombroso de lixo não reciclado em que resultam, incluindo lixo tóxico.

Ninguém imaginou que o poder e o dinheiro se tornariam tão concentrados em megahipercorporações norte-americanas como o Google, que iriam destruir para sempre tantas indústrias e atividades em tão pouco tempo.

Ninguém previu que os mesmos Estados Unidos, graças às maravilhas da internet sempre tão aberta e juvenil, se consolidariam como os maiores espiões do mundo, humilhando potências como a Alemanha e também o Brasil, impondo os métodos de sua inteligência militar sobre a população mundial, e guiando ao arrepio da justiça os bebês engenheiros nota dez em matemática mas ignorantes completos em matéria de ética, política e em boas maneiras.

Ninguém previu a febre das notícias inventadas, a civilização de perfis falsos, as enxurradas de vírus, os arrastões de números de cartão de crédito, a empulhação dos resultados numéricos falseados por robôs ou gerados por trabalhadores mal pagos em países do terceiro mundo, o fim da privacidade, o terrorismo eletrônico, inclusive de Estado.

***


Estupidez de massa
Márion Strecker em 23 de junho 2014 

“Atenção: não me escrevam mais pelo inbox. 
Quem quiser contato comigo, faça-o por e-mail, telefone, pomba voadora, mula, correio, seja lá o que for. 
(“¦) 
A partir de hoje eu caio fora desse Facebook aqui! Saiu das proporções de graça etc. 
Vejo que é ocupação de quem não trabalha! 
(“¦) 
Tem uns que narram (berram) (gritam) o quanto está o jogo, como se ninguém soubesse! E lá vai esse ridículo exercício de clicar “like” (ou “curtir”). 
(“¦) 
Vou manter as páginas abertas por medo de clonagem (já aconteceu três vezes antes quando tentei fechar isso), mas não lerei os comentários e não lerei os recados da inbox. 
Bom trabalho, seus vagabundos! Curem-se da solidão e realizem-se na vida 
(“¦).”

Com essa mensagem, o autor e diretor de teatro Gerald Thomas abandonou sua página no Facebook semana passada. 
Não foi a primeira vez. 
Alguns vão lembrar que ele também já anunciou o abandono do teatro, mas acabou voltando, como antigos namorados voltam a namorar, restando aos amigos reconstruir os vínculos depois da clássica e traumática divisão entre os “amigos dela” e “os amigos dele”. 
Talvez ele volte ao Facebook. Talvez não. 
Mas isso não muda o principal: o Facebook promove uma “estupidez de massa”, como escreveu Gerald na despedida. 
Concordei, mas me abstive de clicar o botão Like, já que ele não ia ver mesmo.

Sei que vou receber mensagens de contestação, elogiando o Facebook e mencionando fatos bacanas, a diversão, a proximidade com os amigos, tralalá. 
Eu também poderia mencionar amigos de infância que reapareceram, amigos distantes que parecem próximos, coisas engraçadas ou, com sorte, informações relevantes. 
Nada disso é capaz de ocultar o tsunami de bobagens, idiossincrasias e “vergonha alheia” que o Facebook patrocina.

Faz sentido?

Ninguém pode querer ver de tão perto tanta gente o tempo todo. 
Ou será que alguém neste Brasil tão sociável é capaz de manter baixinho o número de conexões? Eu não sou, apesar da indecente pilha de “pedidos de amizade” sem leitura nem solução. 
Primeiro eu tinha critérios: pessoa jurídica não aceito como amigo; só aceito quem conheço, quem publica foto ou é amigo de amigos etc. Nenhuma regra deu certo. 
Não me peçam coerência. Agora é ao acaso. Vi, vi. Não vi, não vi.

Enjoei de tanta gente fotografada para consumo externo, tanto VIP, tanto lugar paradisíaco, tanta lua cheia, tanta opinião a respeito de tudo, tantos animais de estimação, tantos aniversariantes, tantas crianças, tantas mensagens edificantes, tantas piadas, tanto leva-e-traz, tanto proselitismo, tanta má-criação.

Só há uma maneira de lidar com o Facebook, é a esmo. 
Então que ninguém fique magoadinho se deixei de ver o seu status, evento ou aniversário. Fracassei. Desisti.

Mas diferentemente do Gerald, parece que agora vou ler as mensagens que chegam no inbox, se forem poucos os que me escreverem e não vierem mensagens de grupo ou propaganda. 
E sabe o que fiz hoje? Instalei o Messenger do Facebook no celular. 
Meu jovem assistente, o André, recomendou. 
Seria um bom jeito de receber mensagens privadas de amigos do Facebook sem entrar no Facebook. 
Isso além de SMS, e-mail, celular, WhatsApp, Skype, Instagram... 
Será que faz algum sentido isso tudo?


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(*) Marion Strecker é jornalista e cofundadora do UOL