quarta-feira, 27 de março de 2013

"ANTIGAS TERNURAS"


O título desta postagem está entre aspas porque é o mesmo de um blog muito bonito.
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Às vezes releio agendas antigas, reviro minhas 'coisinhas' guardadas e não raramente encontro umas preciosidades como esse papel amarelado pelo tempo, em cópia de carbono, datilografado, (humm, 'carbono', 'datilografado', palavras em desuso por desaparecimento dos objetos) que publico a seguir.

Recebi esse texto de uma conhecida, na época, que fazia um trabalho social na APMIR, instituição hospitalar onde nasceram minhas filhas. Foi há 36 anos - 36! - , por ocasião do nascimento da minha filha caçula e hoje, no Facebook (neste caso, bendita internet!), descobri que quem o escreveu está na lista de contatos de outros amigos. Deixo as coisas como estão. Nem sempre precisamos reativar o passado. Apenas continuo sensível às manifestações de carinho. Vamos lá:
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Juventude
General Douglas MacArthur, em 1945

"A juventude não é um período da vida;  a juventude é um estado de espírito, um efeito da vontade, uma qualidade da imaginação, uma intensidade emotiva, uma vitória do valor sobre a timidez, do gosto pela aventura sobre o amor ao conforto.
Alguém não se torna velho por haver vivido um certo número de anos; torna-se velho porque desertou dos ideais.  Os anos enrugam a pele, mas a renúncia a um ideal enruga a alma.
As preocupações, as dúvidas, os temores e as desesperanças são os inimigos que, lentamente, nos fazem vergar para o chão e nos convertem em pó antes da morte.
Jovem é o que se deslumbra e se maravilha... o que pergunta como o menino - E depois?... Jovem é o que desafia os acontecimentos e encontra alegria no jogo da vida.  As provas galvanizam-no, os fracassos o tornam mais forte, as vitórias o fazem melhor.  Serás tão jovem como tua fé, tão velho como tuas dúvidas;  tão jovem como a confiança que tenhas em ti, tão velho como tuas desesperanças;  e mais velho ainda como o teu abatimento.
Permanecerás jovem, tanto quanto permaneceres verdadeiramente generoso, tanto quanto sentires o entusiasmo de dar alguma coisa de ti: pensamentos, palavras, amor;  tanto quanto o fato de dar alguma coisa, te der a impressão de receber; e, por conseguinte, de sempre estar devendo e desejando dar mais.
Permanecerás jovem, enquanto fores receptivo a tudo quanto é belo, bom e grandioso, podendo desfrutar das mensagens da natureza do homem e do infinito.
Se um dia,m qualquer que seja a tua idade, teu coração foi mordido pelo pessimismo, torturado pelo egoísmo, roído pelo cinismo, que Deus tenha piedade de tua alma de velho". 
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Abaixo do texto datilografado, um bilhete escrito a mão:
"Sueli
Espero que este nenem chegue e a encontre em estado de juventude e portanto de paz.
Toda ternura e afeto da

(assinatura)"  - que deixo incógnita porque prefiro assim.

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terça-feira, 26 de março de 2013

Filme WALL STREET - O dinheiro nunca dorme



Ninguém mais ignorante que eu em relação a Economia, Finanças, Sistemas Financeiros, ou sei lá que coisas são essas que 'movem o mundo'.
Sou das Letras, das Artes; gosto de música, dança, poesia, literatura, teatro, cinema, artes plásticas.

Por isso, estranhei em mim mesma o interesse em assistir hoje, na TV,  ao filme 'Wall Street - o dinheiro nunca dorme'. Em outros tempos, eu evitaria um título que entrega tão claramente o enredo.

Acho que foi por estar em casa entediada, cansada do trabalho doméstico, nesta tarde nubladinha, sem graça.
Mas, quer saber? Foi muito bom para me arrancar deste mundinho fictício e bonitinho no qual me escondo, tentando acreditar nas pessoas, na vida, nos valores e princípios éticos nos quais fui educada e...  - sem mágoas, papai e mamãe - venho 'me ferrando' ao longo da vida.

O que o filme me mostra é que em qualquer época, o ser humano é sempre o mesmo,  não importando a chamada 'evolução', porque a riqueza material, o poder, a ganância, a mentira são os principais motores desse mundo - e ele se move, ah, como se move... A intenção do filme me parece esta mesmo: reiterar que as pessoas são o que o seu dinheiro consegue comprar.
Gente, nem a tal globalização deu uma disfarçada nisso. Tudo gira em torno do lucro, a qualquer custo.

Claro, leio os jornais - por mais desanimadoras que sejam as notícias - e sei que quando há uma grande crise econômica em qualquer lugar do mundo, sempre há também quem se beneficie e lucre com isso. Também nas guerras é assim. Faz lembrar alguns velhos ditados: 'a desgraça de alguém pode ser a felicidade de outro'; 'farinha pouca, meu pirão primeiro'; 'na vida, enquanto um chora o outro ri',  e vai por aí...

Mas o filme é interessante e menciona acontecimentos do mundo atual como o fim da tal 'bolha' da internet - aquela moda,  no final do século passado, de  abrir uma empresa 'ponto.com'  e enriquecer rapidamente.
Como sempre acontece, todo modismo atinge também o vocabulário e é muito engraçado ver como as pessoas se adaptam facilmente às novas expressões e palavras de ordem, geralmente em inglês: net working, business plan...  Ai, que todo mundo só falava inglês e quem não entendesse não era nem considerado nas rodinhas de conversa. No momento atual também surgiu uma palavra chave: empreendedorismo (epa!, quase me atrapalho)  Ô antipatia...
Realmente o dinheiro jorrou e depois levou muita gente à falência quando surgiu o famoso boato do 'bug do milênio' - lembram? .  Boato, sim, porque nem aconteceu e as empresas gastaram muito se prevenindo. Mais uma maluquice.
O filme cita ainda a crise dos Estados Unidos em 2007, que até hoje é assunto e se reflete no mundo inteiro. Enfim, traz algumas informações.

Aliás, não só no mundo das finanças, tudo segue as transformações criadas, inventadas pelo admirável bicho homem, esse sobrevivente sempre em busca de coisas, sempre insatisfeito - diferente das outras espécies e por isso considerada superior - e que poderia, sim, ser bem melhor se melhor usasse suas possibilidades e seus dons.

Será sempre assim. Podem vir os melhoramentos tecnológicos, novas invenções - ah, o bicho homem vive inventando, que bom! - pode vir qualquer modificação externa, porque não é isso que mudará nossa infeliz condição humana. Estamos só de passagem mas os aproveitadores não querem saber.

Não posso dizer que não tenha gostado do filme. Gostei, e também porque o protagonista é Michael Douglas, ator que admiro, entretanto o que ficou para mim é essa sensação já conhecida de que o ser humano é uma coisa muito interessante: fica insistindo em 'racionalidade', 'espiritualidade', 'solidariedade', 'humanidade', tanto 'ade'... - será que esquecemos a 'falsidade'?
Sim, porque nada me soa mais falso do que essa mania de nos considerarmos a 'melhor espécie'. Não sobreviveríamos isolados, sem ajuda do outro, mas agimos de forma individual, cada um tratando dos próprios interesses sem ligar a mínima para o seu dito semelhante.

Quando aparece alguém diferente disso, ou é endeusado ou esculhambado, dependendo do 'lucro' que se possa ter com o inocente até então inútil.
Se aquele 'bestalhão humanitário' tiver  influência bastante sobre as pessoas para trazer dinheiro para a roda, tudo bem. Se não, melhor sumir com ele...

Daí... os políticos influentes, os empresários influentes, enfim, os manipuladores.

Em resumo, foi isso que fiquei pensando.

Como a maioria dos filmes americanos que se pretendem politicamente corretos, é claro que tem 'happy end'.  Fica tudo certinho, tudo bonitinho e 'humanizado como deve ser'.

Sei que é uma visão um tanto dura, mas...
dá-lhe Chico Buarque:

"(...) Aprende, meu filho,
dessa lição você vai precisar:
Se você repete um só estribilho
no coco do povo, e bate e martela,
o povo acredita naquilo só.
Acaba engolindo qualquer balela,
acaba comendo sabão em pó."  (in: "Gota d'água")

dá-lhe Camões:

"Os bons vi sempre passar
No mundo graves tormentos;
E para mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos."  (in: 'Ao desconcerto do mundo')

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Noossa! O que um filminho pode fazer com a cabeça da gente... kkkkkkkkkk!!!!!!!!!

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A que ponto chegamos...




Diretora agredida por aluno desabafa em rede social – O GLOBO, 26-03-2013

Estudantes protestam contra violência em escola de Piedade onde diretora foi agredida
Maria Elisa Alves / O Globo

RIO — O encontro entre um adolescente rebelde, aluno de um projeto para alunos com defasagem idade-série, e uma profissional tida como durona terminou em agressão, na última quinta-feira, na Escola Municipal João Kopke, em Piedade, na Zona Norte.
A diretora Leila Soares foi empurrada e recebeu um soco no rosto após repreender um estudante de 15 anos que brincava de brigar no pátio. Leila publicou um desabafo sobre a agressão sofrida em sua página no Facebook.
“O agressor sai de cabeça erguida, olhando para trás e rindo. Não só do agredido, mas de cada um de nós”, diz trecho do depoimento da diretora.

Na segunda-feira, a violência foi do lado de fora da escola: alunos que faziam uma manifestação a favor da diretora tiveram seus cartazes rasgados por amigos do agressor. Na confusão que se armou, um deficiente físico levou dois socos no rosto.
— Aqui do lado de fora sempre tem briga, mas agressão ao diretor foi a primeira vez — disse Miguel Maciel, de 12 anos, aluno do 7º ano, mesma série do agressor.

Segundo os alunos, Leila flagrou o aluno brigando de lutar com um amigo. Ela mandou que eles parassem e teria sido empurrada pelo aluno. Leila avisou que iria ligar para a mãe do jovem e para a Ronda Escolar, da Guarda Municipal. Diante da ameaça, o rapaz teria dado um soco no rosto da diretora.
A diretora e o aluno foram para a 24ª DP (Piedade), onde Leila contou que o estudante, após tê-la socado, saiu rindo pelo corredor. Como estava com muita dor no ouvido, ela foi encaminhada ao Hospital Salgado Filho. Depois ela foi ao Instituto Médico-Legal fazer exame de corpo delito, que não apontou lesão externa. Mas, como ela continuou sentido dores, será feito um exame complementar.
Segundo a delegada Cristiane Carvalho, Leila não apresentava hematomas, mas estava muito abalada. O estudante, morador do Morro do Adeus, foi autuado por fato análogo a lesão corporal. A mãe do adolescente se comprometeu por escrito a levá-lo à Vara da Infância e da Juventude, onde ele deverá ser punido com uma medida socioeducativa, que pode ir da advertência verbal à internação compulsória.
— A mãe estava irritada e disse que não iria mais procurar colégio para ele, dando a entender que ele já tinha tido problemas antes. Ele admitiu na delegacia ter dado um soco na diretora e não demonstrou arrependimento — disse a delegada.

Desde 2003, 53 agressões

Em nota, a Secretaria municipal de Educação disse que o aluno foi transferido para outra escola e que aplicou o Regimento Escolar Básico do Ensino Fundamental. E disse ainda que a diretora, que está na escola desde 2009, ficará em licença por dez dias.
A secretária de Educação, Claudia Costin, classificou o fato de “triste e lamentável”.
Segundo dados da secretaria, desde 2003, foram registradas 53 agressões — verbais e físicas — de alunos a professores que resultaram em sindicâncias.
Wiria Alcântara, diretora do Sindicato Estadual dos Profissionais de Ensino, observa que agressões dentro de escola têm sido cada vez mais rotineiras:
— As crianças estão muito violentas, refletindo o que acontece na sociedade. E as escolas não estão preparadas.

Depoimento da diretora:

“Quantas vezes nos indignamos quando sabemos de casos de agressões a colegas, profissionais como nós. Mas não nos indignamos o suficiente por acharmos que ainda está muito distante...
De repente, chega a nós.
O corpo dói. Mas a dor vai passando com gelo, analgésico, remédios...
O coração, este fica tão apertado que parece que sobra espaço em torno dele de tão pequeno. Este espaço é preenchido com dor. Que não tem remédio.
(...) Sofremos nós, nossos parentes, nossos amigos, nossos companheiros.
Sofre uma sociedade inteira que vive temerosa porque não temos quem nos proteja.
O agressor sai de cabeça erguida, olhando para trás e rindo. Não só do agredido, mas de cada um de nós. Ri do erro...
Ri da sociedade que fica refém enquanto ele continuará empurrando, xingando, ameaçando, chutando, socando...
(...) Quem somos nós, Educadores? Somos aqueles de quem ri o que sai impune, olhando para trás e rindo.
Serei só mais uma? Ou a última?”

OS COMENTÁRIOS SOBRE O ASSUNTO:

Maleum Maleficarum 26/03/13 - 10:01
Anos seguidos de politicas pró bandidos mirins por parte de governos pífios é que geram esse tipo de fato. Criança precisa de limites e educação, duas coisas que só podem ser dadas pelas famílias. Escola é apenas um preparador cultural.
há 54 segundos

Alexsandra Moraes 26/03/13 - 10:01
Fui professora e não quero mais!!! Nem se pagassem milhões eu quereria novamente! E não é só por essas coisas, mas principalmente por que não acredito mais na educação. Perdi a fé. Como entrar em uma sala de aula e fazer algo em que não se acredita? Educação vem de casa, parece clichê, mas é isso mesmo. Não tô aqui para educar filho dos outros. Educação na escola é acadêmica e cidadania e só, todo o resto vem de casa. Valores! Isso não se ensina nas escolas.
há 1 minuto

Lauro Santos Norbert Costa 26/03/13 - 10:01
Esse "aluno" é um aprendiz de bandido. Merece é apanhar e muito. Se ficar solto, em breve vai estar nas páginas policiais de jornais. E, do jeito que é , não vai viver muito. Pau que nasce torto não se emenda, diz o antigo ditado. Não adianta medidas sócio-educativas, ele é antes de tudo um ser anti-social. Já está atrasado na escola pública, que é fraca, e ainda por cima bate na professora. O que esperar de um sujeito assim?
há 1 minuto

Alberto Roberto 26/03/13 - 10:00
Só mesmo aqui no Brasil petista essas coisas ficam impune, num país sério esse garoto seria preso, fichado na polícia e expulso do colégio, e ainda levaria um castigo dos próprios pais além de ser obrigado a pedir desculpas a professora e aos alunos tb pela sua covardia.
há 2 minutos

Vitruvio 26/03/13 - 09:58
Os maus exemplos vêm de cima. Os chefes da nação têm debochado do povo e o povão os imita. Esse é o Brasil do futuro, que já chegou e o pior ainda está por vir.
há 4 minutos
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segunda-feira, 25 de março de 2013

MELHOR ESQUECER...

Tela de Eduardo Arguelles

Época muito dura, muito pesada para uma menina. Uma menina, sim.
Naquele tempo, aos dez anos de idade, meninas eram crianças, não arremedo de adolescentes ou adultas em potencial. Eram crianças.
Muitas dessas crianças, entretanto, compreendiam mais da vida do que aqueles que cochichavam pecados alheios sempre com um riso maldoso cortando suas caras fingidas e compungidas.
Memória gigantesca trazendo lembranças desconfortáveis da adulta  hipocrisia  que a cercava. Preferiu  ignorar e calar. Calava, mas implodia; observava apenas. E aprendia.
Tentativas - ingênuas, inúteis - de construir uma história própria, singular, sem qualquer identificação genealógica.
E aprendia, sempre.
Aprendeu tanto que ainda se cala.
Mesmo diante das fotos antigas, pretensamente saudosas, agora tão facilmente resgatadas e expostas - tecnologia, ora - o silêncio parece ser a única reação decente. 
Talvez seja como a personagem Sérgio em sua 'crônica das saudades' (O Ateneu", de Raul Pompeia) : "Saudades, verdadeiramente? Puras recordações, saudades talvez, se ponderarmos que o tempo é a ocasião passageira dos fatos, mas sobretudo - o funeral para sempre das horas."   

Itatiaia, 25 de março de 2013
Sueli
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No início de "O Ateneu":
..." Lembramo-nos, entretanto, com saudade hipócrita, dos felizes tempos; como se a mesma incerteza de hoje, sob outro aspecto, não nos houvesse perseguido outrora e não viesse de longe a enfiada das decepções que nos ultrajam.
Eufemismo, os felizes tempos, eufemismo apenas, igual aos outros que nos alimentam, a saudade dos dias que correram como melhores. Bem considerando, a atualidade é a mesma em todas as datas. Feita a compensação dos desejos que variam, das aspirações que se transformam, alentadas perpetuamente do mesmo ardor, sobre a mesma base fantástica de esperança, a atualidade é uma. Sob a coloração cambiante das horas, um pouco de ouro mais pela manhã, um pouco mais de púrpura ao crepúsculo - a paisagem é a mesma de cada lado beirando a estrada da vida."  
(RAUL POMPEIA)

sábado, 23 de março de 2013

Presentinhos no Facebook

O dia começou bem!  
Minha amiga e ex aluna Cris Vale nos brindou com esses dois post no Facebook.
Obrigada, menina!


 Manuel Bandeira, Chico Buarque, Tom Jobim e Vinícius de Moraes




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quarta-feira, 20 de março de 2013

"Última Flor do Lácio, inculta e bela"




É... tô queimando a minha língua... (sem trocadilhos, por favor).
Vivo afirmando - acho que é autodefesa (nesses tempos, nunca se sabe...) - que apenas envelheci e não que fiquei demente, surda, analfabeta ou desmemoriada. Agora já não sei mais... será que 'eles' têm razão?...
Ainda bem que me afastei da carreira, embora continue amando a profissão escolhida.
Olhem isso aí: é extenso, mas vale a pena.
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Enem 2012: textos nota 1000 têm erros como ‘enchergar’ e ‘trousse’
Redações também apresentam graves desvios de concordância

17/03/13 - 23h00
Atualizado:
18/03/13 - 8h20

RIO — “Rasoavel”, “enchergar”, “trousse”. Esses são alguns dos erros de grafia encontrados em redações que receberam nota 1.000 no Exame Nacional de Ensino Médio 2012 (Enem).

Durante um mês, O GLOBO recebeu mais de 30 textos enviados por candidatos que atingiram a pontuação máxima, com a comprovação das notas pelo Ministério da Educação (MEC) e a confirmação pelas universidades federais em que os estudantes foram aprovados. Além desses absurdos na língua portuguesa, várias redações continham graves problemas de concordância verbal, acentuação e pontuação.

Apesar de seguirem a proposta do tema “A imigração para o Brasil no século XXI”, os textos não respeitavam a primeira das cinco competências avaliadas pelos corretores: “demonstrar domínio da norma padrão da língua escrita”. 
Cada competência tem a pontuação máxima de 200 pontos.

Segundo o “Guia do participante: a redação no Enem 2012”, produzido pelo MEC, os 200 pontos na competência 1 são atingidos apenas se “o participante demonstra excelente domínio da norma padrão, não apresentando ou apresentando pouquíssimos desvios gramaticais leves e de convenções da escrita. (...) Desvios mais graves, como a ausência de concordância verbal, excluem a redação da pontuação mais alta”.

O manual aponta, entre os desvios mais graves, erros de grafia, acentuação e pontuação. Na mesma redação em que figura a grafia “rasoavel”, palavras como “indivíduos”, “saúde”, “geográfica” e “necessário” aparecem sem acento. E ao menos dois períodos terminam sem o ponto final.

Em outro texto recebido pelo GLOBO, aparecem problemas de concordância verbal, como nos trechos “Essas providências, no entanto, não deve (sic) ser expulsão” e “os movimentos imigratórios para o Brasil no século XXI é (sic)”. O mesmo candidato, equivocadamente, conjuga no plural o verbo haver no sentido de existir em duas ocasiões: “É fundamental que hajam (sic) debates” e “de modo que não hajam (sic) diferenças”.

Uma terceira redação nota 1.000 apresenta a grafia “enchergar”, além de problema de concordância nominal no trecho “o movimento migratório para o Brasil advém de necessidades básicas de alguns cidadãos, e, portanto, deve ser compreendida (sic)”. Em outro texto, além da palavra “trousse”, há ausência de acento circunflexo em “recebê-los” e uso impróprio da forma “porque” na pergunta “Porém, porque (sic) essa população escolheu o Brasil?”.

Pós-doutor em Linguística Aplicada e professor da UFRJ e da Uerj, Jerônimo Rodrigues de Moraes Neto diz que essas redações não deveriam receber a pontuação máxima.
— A atribuição injusta do conceito máximo a quem não teve o mérito estimula a popularização do uso da língua portuguesa, impedindo nossos alunos de falar, ler e escrever reconhecendo suas variedades linguísticas. Além disso, provoca a formação de profissionais incapazes de se comunicar, em níveis profissional e pessoal, e de decodificar o próprio sistema da língua portuguesa — aponta Moraes Neto.

Claudio Cezar Henriques, professor titular de Língua Portuguesa do Instituto de Letras da Uerj, reitera que, ao ingressar na universidade, esses alunos terão de se ajustar às normas da língua de prestígio acadêmico se quiserem se tornar profissionais capacitados. Ele observa que a banca corretora não usa o termo “erro”, mas “desvio”, algo que, segundo ele, é “eufemismo da moda”.
— A demagogia política anda de braço dado com a demagogia linguística. É preciso lembrar que as avaliações oficiais julgam os alunos, mas também julgam o sistema de ensino. Na vida real, redações como essas jamais tirariam nota máxima, pois contêm erros que a sociedade não aceita. Afinal, pareceres, relatórios, artigos científicos, livros e matérias de jornal que contiverem esses desvios/erros colocarão em risco o emprego de revisores, pesquisadores e jornalistas, não é? — ele indaga.

Logo que o MEC liberou a consulta ao espelho da redação, em fevereiro, o site do GLOBO publicou uma reportagem pedindo que estudantes enviassem redações com nota 1.000, junto com seus comprovantes. O objetivo era expor os bons exemplos no site. Porém, ao ler as redações, a equipe percebeu erros gritantes em várias dissertações. Foram enviadas ao MEC, então, quatro delas. Para não expor os alunos, os textos foram digitados, e as informações pessoais (nome, CPF e número de inscrição), omitidas. 
O GLOBO perguntou se os desvios não desrespeitavam os critérios estabelecidos pelo manual do MEC, e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anysio Teixeira (Inep) alegou que não comenta redações: “por respeito aos participantes, a vista pedagógica é dada especificamente a quem prestou o exame”.

Segundo o Inep, “uma redação nota 1.000 deve ser sempre um excelente texto, mesmo que apresente alguns desvios em cada competência avaliada. A tolerância deve-se à consideração, e isto é relevante do ponto de vista pedagógico, de ser o participante do Enem, por definição, um egresso do ensino médio, ainda em processo de letramento na transição para o nível superior”.

Sobre os critérios usados na correção da redação do Enem 2012, estabelecidos pela coordenação pedagógica do exame, a cargo de professores doutores em Linguística da Universidade de Brasília (UnB), o Inep informa que a análise do texto é feita como um todo. Segundo a nota, “um texto pode apresentar eventuais erros de grafia, mas pode ser rico em sua organização sintática, revelando um excelente domínio das estruturas da língua portuguesa”.

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segunda-feira, 11 de março de 2013

Zuenir Ventura -"Ah, o meu facebook"


Ah, o meu ‘Fakebook’
Zuenir Ventura, O Globo, 11 de março de 2013

Graças ao colega André Miranda, descobri que há meses tenho uma concorrida página no Facebook, onde já recebi 600 amigos, muitos novos, alguns velhos e outros desconhecidos, dei opiniões, fiz recomendações, ditei regras, disse coisas aceitáveis e muita bobagem.

E, sobretudo, fiz muita propaganda da Editora Lecto, à qual deveria cobrar pelo merchandising involuntário.

Cheguei a elogiar o novo logotipo e anunciar a contratação de “vendedores, pareceristas e diagramadores”. Também recomendei uma nova rede social, uma certa Dotpipol, “muito melhor do que o Facebook” (uma seguidora chegou a dizer: “Com prazer vou lá para ler seus textos.”)

Teria sido uma experiência interessante, se não se tratasse de um falso Facebook. Com perdão do trocadilho, é um Fakebook, pois não criei a página, não autorizei ninguém a criá-la e fico me perguntando se não há um filtro ou uma forma de controle para impedir uma fraude virtual como essa, tão fácil de ser perpetrada.

Basta pegar fotos já publicadas em revistas ou jornais, recolher dados biográficos no Google ou na Wikipédia, inventar algumas histórias, e pronto: que venham os incautos. E qualquer um pode cair nesse conto do vigário moderno.

Como adivinhar o que é fake em meio a algumas informações corretas e outras que poderiam ser?

Tudo bem que, dizem, você reclama e a página é retirada do ar. Mas e se você não descobrir por conta própria ou através de um amigo? E se o estrago, se houver, já tiver sido feito? Como os leitores desta coluna não são necessariamente os daquela página, como avisar a todos? Não haveria um jeito de punir os autores por apropriação indébita de identidade?

Houve coisas engraçadas, como a descoberta de três raros homônimos — um jovem “Zuenir Ventura”, “Zuenir Brito” e “Claudio Zuenir” — e outras tocantes, como pessoas me agradecendo por tê-las adicionado. O que mais me irritou foi ver gente de boa-fé sendo envolvida candidamente no golpe.

Li mensagens generosas, como a de um leitor cujo nome não cito porque não pedi sua autorização: “Que mal fiz eu para não ter conhecido a obra deste escritor há mais tempo?”

No lançamento do livro do Merval, Leiloca, a Astróloga, me comunica que entrou no meu Facebook. Só me restou pedir desculpas por ter-lhe causado a decepção de se ver enganada, ela, a quem os astros não costumam enganar.

De qualquer maneira, alguém deveria ter notado que, sem Alice uma vez sequer, tudo não passava de uma farsa.

PS: Acabo de saber que a página foi cancelada, ou, de acordo com o aviso, “não está mais disponível”. Ainda bem.


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terça-feira, 5 de março de 2013

ENVELHECER


Envelhecer bem é possível
Anna Veronica Mautner (*)

A criança passa por dramáticas transformações (andar, falar, conhecer o mundo etc.), mas não tem consciência delas porque lhe falta linguagem para descrevê-las.

Depois da adolescência as mudanças continuam, mas com dramaticidade menor.

Tão marcante em transformações quanto a infância é o envelhecimento. Nessa fase da vida temos consciência de tudo o que ocorre: perdas físicas e mentais.

Comecemos falando da reação aos imprevistos. Por que velho tropeça e cai tanto? Porque a reação ao susto e o reflexo para evitar o perigo são mais lentos.

Falemos agora da memória, essa capacidade madrasta cuja falta castiga o idoso. 
Demoramos para lembrar seja lá o que for e a conversa fica entrecortada de silêncios, quase soluços.
O conteúdo que em primeiro lugar mergulha nas sombras do esquecimento são os nomes próprios; mais uns anos e substantivos comuns também se embaralham.

O curioso é que os adjetivos não somem. Aparecendo o nome, sua qualidade ou quantidade vem junto, dos fundos da memória. O nome está em algum lugar, algum tempo, de algum jeito. Se o substantivo emerge, traz consigo as associações.

Os verbos não somem, mas as ações deixam de ser desempenhadas. Se o verbo desaparecer, a incomunicabilidade irá se instaurar.

Envelhecer é perder: seja clareza, seja acuidade auditiva ou visual, velocidade de resposta física ou de linguagem, memória.

Aí vem aquela história: velho esquece o agora e lembra o mais antigo. Não há nenhum mistério nisso. É que o antigo já se transformou em imagem e a imagem reaviva as sensações. Quase nada é inconsciente, pois envelhecer é viver as mudanças diárias.

Sentimos a presença das mudanças. Se causam amargura, é pela não aceitação. E, se não aceitarmos que já não somos o que éramos, o nosso contato com o mundo aqui e agora fica prejudicado.

Assim como é natural o ser humano se transformar ininterruptamente, em boa velocidade, do nascimento à puberdade, é natural envelhecer, com lentas perdas no início e mais rápidas depois.

Aceitando que viver é assim, permanente transformação, podemos sorrir diante de perdas e transmitir (até com humor) a quem nos rodeia que estamos presentes, acompanhando o processo.

Nada de dizer que a terceira idade é maravilhosa. Nada disso. Perder não é bom. Mas alguns conseguem ir perdendo sem muita amargura, porque acompanham as transformações dos que ainda estão ganhando.

É a alegria do avô diante do neto. Há na atitude de acompanhar o que já tivemos no passado doses de aceitação e generosidade. Podemos ajudar. Nossa sabedoria funciona como conforto para quem está só começando.

O olhar bondoso do idoso diante do tatibitate do nenê é sabedoria. O velho vislumbra o caminho que o bebê irá seguir. Não é um reviver nem um renascer: é uma memória.

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(*) Anna Veronica Mautner psicanalista da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, é autora de "Cotidiano nas Entrelinhas" (Ed. Ágora) e "Educação ou o quê?" (Ed. Summus).

sexta-feira, 1 de março de 2013

MACHADO DE ASSIS - 'Capitu'

“Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram.

Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá ideia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros; mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me.

Quantos minutos gastamos naquele jogo? Só os relógios do céu terão marcado esse tempo infinito e breve.

A eternidade tem as suas pêndulas; nem por não acabar nunca deixa de querer saber a duração das felicidades e dos suplícios.” 

(In: "Dom Casmurro")