Tela de Eduardo Arguelles |
Naquele tempo, aos dez anos de idade, meninas eram crianças, não arremedo de adolescentes ou adultas em potencial. Eram crianças.
Muitas dessas crianças, entretanto, compreendiam mais da vida do que aqueles que cochichavam pecados alheios sempre com um riso maldoso cortando suas caras fingidas e compungidas.
Memória gigantesca trazendo lembranças desconfortáveis da adulta hipocrisia que a cercava. Preferiu ignorar e calar. Calava, mas implodia; observava apenas. E aprendia.
Tentativas - ingênuas, inúteis - de construir uma história própria, singular, sem qualquer identificação genealógica.
E aprendia, sempre.
E aprendia, sempre.
Aprendeu tanto que ainda se cala.
Mesmo diante das fotos antigas, pretensamente saudosas, agora tão facilmente resgatadas e expostas - tecnologia, ora - o silêncio parece ser a única reação decente.
Mesmo diante das fotos antigas, pretensamente saudosas, agora tão facilmente resgatadas e expostas - tecnologia, ora - o silêncio parece ser a única reação decente.
Talvez seja como a personagem Sérgio em sua 'crônica das saudades' (O Ateneu", de Raul Pompeia) : "Saudades, verdadeiramente? Puras recordações, saudades talvez, se ponderarmos que o tempo é a ocasião passageira dos fatos, mas sobretudo - o funeral para sempre das horas."
Itatiaia, 25 de março de 2013
Sueli
* * *
No início de "O Ateneu":
..." Lembramo-nos, entretanto, com saudade hipócrita, dos felizes tempos; como se a mesma incerteza de hoje, sob outro aspecto, não nos houvesse perseguido outrora e não viesse de longe a enfiada das decepções que nos ultrajam.
Eufemismo, os felizes tempos, eufemismo apenas, igual aos outros que nos alimentam, a saudade dos dias que correram como melhores. Bem considerando, a atualidade é a mesma em todas as datas. Feita a compensação dos desejos que variam, das aspirações que se transformam, alentadas perpetuamente do mesmo ardor, sobre a mesma base fantástica de esperança, a atualidade é uma. Sob a coloração cambiante das horas, um pouco de ouro mais pela manhã, um pouco mais de púrpura ao crepúsculo - a paisagem é a mesma de cada lado beirando a estrada da vida."
(RAUL POMPEIA)
(RAUL POMPEIA)
Nenhum comentário:
Postar um comentário