terça-feira, 11 de novembro de 2014

SARAMAGO e PLATÃO


Saramago e a pergunta: vivemos hoje o mito da caverna?
Nicole Ayres Luz - "Homo Literatus", fevereiro 2014

Um grupo de pessoas vive preso dentro de uma caverna escura.
Diariamente, essas pessoas veem sombras projetadas nas paredes de objetos carregados pelos outros. Elas acreditam que aquilo é a realidade.
Até que um dos prisioneiros, desconfiado, resolve se libertar das correntes que o prendem e sair da caverna.
Assim que sai, ele é iluminado pela luz do sol, à qual seus olhos demoram um pouco para se acostumar.
Maravilhado com suas descobertas sobre o mundo lá de fora, ele volta para contar aos colegas o que viu.
Muitos não acreditam e o desprezam, porém alguns o acompanham rumo à liberdade.

Conseguiu identificar a história? Sim, trata-se do Mito da Caverna, desenvolvido pelo filósofo da Antiguidade grega Platão.
Ok, e o que isso tem a ver com literatura?
(...)

José Saramago, em uma entrevista, declarou:
“Hoje é que estamos a viver, de fato, na Caverna de Platão, pois as imagens que nos são mostradas da realidade, de certa maneira, substituem a realidade”.

Se não tomamos o cuidado de filtrar aquilo que assistimos, podemos acabar acreditando nas sombras dos objetos e ficando presos na caverna. Se não procuramos ler, debater, refletir, ouvir pontos de vista diferentes, ficamos limitados à escuridão da nossa própria ignorância.

A literatura liberta. É uma maneira de ler e sentir o mundo.
(...)

Saramago, na mesma entrevista, ressalta a importância de uma pausa para respirar, olhar as flores, por exemplo, e observar seu crescimento.
Num mundo em que somos bombardeados por informações de todos os tipos e pressionados a realizar as mais diversas tarefas, enfrentando uma rotina dinâmica, muitas vezes maçante, corremos o risco de perder as emoções mais preciosas e os pensamentos mais instigantes.

Sem tempo para devaneios “inúteis”, corremos o sério risco de perder de vez a nossa sensibilidade e o nosso discernimento. Viramos máquinas, seres passivos, crentes, submissos, apáticos.
A literatura ajuda a resgatar a nossa humanidade latente.

No vídeo da entrevista com Saramago, há também comentários de um psicólogo americano, que reitera a importância do ritual de contar histórias.

Uma criança que pede para ouvir uma história antes de dormir (apesar de eu ter as minhas dúvidas se isso ainda existe), por exemplo, não está tão interessada no enredo da história em si, mas na potência criativa da ficção, que estimula a imaginação e o raciocínio.
Somos feitos de histórias. De carne, osso e pensamento. Não devemos desperdiçar nosso potencial vivendo das sombras do que poderíamos ser.



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