Trechos finais de “A VITÓRIA DO MAL E A FALÊNCIA DAS RELIGIÕES”
Alberto Coutinho – em “Obvious – Recortes”
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“Na medida que se aprofunda no caminho do individualismo/egoísmo o homem moderno se molda à imagem daquilo que o capitalismo tem de pior que é interpretar a vida como um produto descartável que, combinado com o instinto de sobrevivência, faz o homem voltar a ser lobo do próprio homem. O pacto social já não basta para evitar este canibalismo, pois a nossa capacidade de ferir, machucar, levar a dor, sofrimento e morte aos mais fracos se supera a cada século.
Tal conclusão embora trágica é uma constatação histórica baseada em fatos materiais, estatísticas e vivenciadas por milhões de pessoas diariamente pelo nosso mundo.
A felicidade do próximo não tem o menor valor e a satisfação imediata das necessidades ou superfluidades individuais é o que importa mesmo que outros estejam sendo prejudicados e que no final não sobre nada para nossos filhos e netos.
Nesse contexto em que a felicidade coletiva perde sua importância, as religiões se transformaram no maior estimulador desse individualismo/egoísmo ao valorizar a fuga individual da morte para um paraíso improvável em detrimento da construção do reino de paz aqui e para todos.
Muitos religiosos planejam sua ida para um paraíso sem ao menos manifestar preocupação pelos amigos, filhos, mães, pais, maridos e esposas que supostamente amam mas não ligam se vão sofrer com queimaduras que nunca cicatrizam, conforme a pregação de um ardoroso líder cristão.
Outro exemplo desse individualismo/egoísmo estimulado pelas religiões majoritárias é que a maioria dos religiosos modernos dificilmente se preocuparia com quem está faminto, com quem sofre com as guerras, ou padece de doenças. Caso atentem para o fato de que existem seres humanos que sofrem, seu interesse maior é o de "levar a palavra" e contabilizar mais alguém que conheceu "a palavra" por seu intermédio, garantindo assim a salvação egoísta de sua própria alma.
Ao expor tal pensamento para um adepto de umas das inúmeras correntes protestantes fui surpreendido com a seguinte frase: “Tem que ter uma compensação... eu vou ser bom e não ganho nada com isso?”
Isso ilustra o atual quadro do cristianismo em nosso globo.
Outro lado mais cruel desses religiosos se revela diante das frases repetidas fartamente quando interpelados sobre o sofrimento alheio: "É falta de deus", "Isso que dá não aceitar a Jesus", ou ainda " é tudo adorador de imagem, por isso deus castiga".
Frases essas sempre acompanhadas dos versículos, capítulos e livros habilmente memorizados para "vencer" qualquer debate.
Essa falência por parte das religiões majoritárias em promover e estimular o bem coletivo se deve ao fato de que estas se afastaram dos ensinamentos do fundador da religião cristã (Jesus). Muito embora os ensinamentos de Jesus sejam fartamente verbalizados aos gritos nos locais de cultos, sutilmente o sentido prático do bem foi substituído por atitudes puramente reflexivas e/ou contemplativas que nos coloca à mercê da vontade de um ser superior cuja submissão e adoração (ou adulação) nos levariam às suas graças e assim estaríamos livres e protegidos do castigo eterno, independente de estarmos colaborando para tornar esse mundo um lugar pior.
Outro aspecto que fortalece esse afastamento da religião do bem real foi o banimento da ciência, da racionalidade e da lógica.
Ao infundir a obrigatoriedade da fé cega e não tolerar questionamentos que poderiam servir de exemplo de tolerância para o progresso humano, as religiões majoritárias afastaram as mentes mais críticas e preparadas contribuindo assim com o ceticismo não apenas em relação a um ser supremo e superior mas principalmente em relação ao próprio bem.
Com isso, o mal dominante decorrente desse individualismo ganhou como aliada a ignorância que espalhou a falsa ideia de que o bem supremo provém de uma fonte divina e externa aos homens, retirando nossa responsabilidade de agir e promover esse bem.
A crença no improvável e o sacrifício da inteligência, para os religiosos modernos, se configurou como porta larga para um hipotético céu de facilidades e ócio.
Essa crença no invisível pode ainda trazer um certo conforto egoísta para alguns, que creem cegamente na salvação de sua alma sem o esforço do exercício das virtudes ensinadas por Jesus, mas está longe de resolver o problema da dor e do sofrimento em escala global.
(...)
A humanidade poderia estar num rumo bem diferente caso as religiões mantivessem seu compromisso de orientar a humanidade ao invés de acender nosso histórico espírito de animosidade e competição fermentadas pela superstição e ignorância.
Deveriam as religiões cristãs estimularem uma existência dignificante onde a assunção das virtudes do Cristo nos conduziria a uma vida pacífica sem preocupações com a violência, guerras e a opressão do mais forte
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A diferença de conceitos religiosos, rituais e as formas diferentes como outros povos interpretam a divindade não seriam motivos de preocupação nem de competição, mas de enriquecimento cultural e de alianças, pois os conceitos de amor ao próximo são inerentes a todos os cultos que se propõem a uma aliança com um ser maior.
Nessa utópica sociedade a maior glória seria a morte digna com a certeza de que ajudamos a deixar o mundo melhor para nosso filhos e netos.
Tal sociedade só se localiza no campo da utopia pois a religião cristã, em parte graças às condições históricas que se estabeleceram como a interferência do império romano e a reforma protestante, foi contaminada pelo espírito bélico, pelos interesses políticos e egoístas.
Assim, estes acontecimentos colaboraram para transformar a religião em força de dominação onde aqueles que não estivessem em sintonia com as ideias dos lideres estavam contra o próprio deus.
O mais trágico é que todo o peso da história teria seu efeito diminuído se o ser humano não tivesse também essa propensão ao mal e soubesse ler nas entrelinhas dos ensinamentos de todas as religiões que, independente da existência ou não de um deus ou uma espiritualidade além da morte, o que temos de certo e concreto é esse mundo e a convivência uns dos outros e que somente a prática do bem de forma despretensiosa poderá livrar nossos filhos e netos da triste herança que estamos deixando para eles.
Não basta não fazer o mal,é preciso fazer o bem.
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