50 tons de branco
Artur Xexéo - em O Globo, 01 de maio 2013
No meu tempo de criança, minha cor preferida era o maravilha. O que me atraía nela não eram exatamente seus tons. Em primeiro lugar, gostava do maravilha por poder usar no masculino uma palavra que era evidentemente feminina. Imagino que o maravilha tenha ganhado este nome por lembrar a cor da flor homônima. Eu sei que, nos dias de hoje, ninguém reconhece uma maravilha _ assim, no feminino mesmo, quando é para se falar da flor. E, se reconhecesse, certamente não identificaria a cor a que estou me referindo. Afinal, a maravilha pode ser amarela, branca, vermelha... Mas, assim como a rosa também tem várias possibilidades de cor e todo mundo sabe como é a cor de rosa, a maravilha mais popular é... cor de maravilha!
Isso tudo é para dizer que já faz tempo que o maravilha saiu do nosso vocabulário. Como é que se resume hoje, numa só palavra, o carmim de um rosa arroxeado e brilhante? Imagino que já tenha dado para notar que esta é uma coluna de protesto. Depois de acabar com meu maravilha, o mundo da moda quer acabar com a mais básica de todas as cores: o branco. Isso mesmo: é uma fita-banana. Algumas considerações deste colunista sobre o espanto com que ouviu especialistas em moda classificarem alguns modelos do último Fashion Rio como off-white o que ele acreditava ser gelo transformaram a questão no principal assunto da minha caixa de correio eletrônica.
“Off já dá a indicação de que é um branco não tão branco, ou seja, é um branco puxando para o pérola, ou quase marfim”, explica a leitora Maria Moura. “Gelo é aquele branco que quase dói nos olhos, é quase translúcido, é a cor da geleira. E o branco normal tem o tom que se poderia dizer leitoso.”
Maria Teresa Fernandes parece fazer parte do meu time: “Se é que ainda cabe algum comentário sobre a dita cor, gostaria de acrescentar que off-white me parece o branco que foi mas não é mais, talvez em decorrência do tempo ou da falta do cuidado necessário às roupas da alva cor para que mantenham seu brilho e, obviamente, sua brancura. O que significa dizer que, com perdão dos fashionistas de plantão, off-white nada mais é do que branco encardido, como diria minha avó. Realmente nada tem de gelo ou cinza, sequer pérola. É branco com ar retrô (agora os fashionistas ficarão felizes) e nada mais.”
Estou quase chegando lá. A leitora me ensinou que o off-white é a viúva Porcina das cores, aquela que foi sem nunca ter sido.
O leitor Ronald Lyrio acrescenta um pouco de ciência à discussão: “Apesar de eu ser daltônico, branco é branco, off white é off White. Off white é o branco-neve em que se adiciona um pingo ou pingos de outra cor, preto, amarelo, marrom, enfim, pelo que entendo, qualquer cor que quebre a brancura-rinso.” Talvez o branco-neve do Lyrio tenha a ver com a cor de geleira da Maria Moura. Ou não.
Sinceramente, acho que a discussão do off-white já deu o que tinha que dar. Considero o branco uma cor perdida. Nunca será recuperada. Mas faço aqui um apelo a todos os especialistas em moda; por favor, devolvam meu maravilha.
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Na discussão dos muitos tons de branco, escrevi uma bobagem. Eu sei que isso não espanta ninguém, bobagem é a matéria-prima deste colunista. Mas não custa nada corrigir quando ela é percebida. Talvez perturbado pela descoberta de tantas de suas variações, escrevi que o branco - o branco básico, aquele da caixa de lápis de cor - era a ausência de cores. Ledo engano. É justamente o contrário. É a mistura de todas as cores. O preto é que é a ausência de cores. Ou, como diz o leitor Leo Madureira, “uma superfície branca reflete a faixa visível do espectro eletromagnético (luz). Uma superfície preta absorve a faixa visível”. Agora, nunca mais vou me esquecer.
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