terça-feira, 8 de outubro de 2013

Sobre a arte da escrita...


"Texto significa tecido, teia, uma teia tecida com letras entrelaçadas pelo desejo travestido em aranha; uma aranha ilógica da escrita arranha a pena ao papel e sem nenhuma pena captura o leitor e o devora.
E destas entranhas, desta estranha aranha-teia-texto, inicia uma travessia.
Uma travessia pela escrita, onde o escritor atravessa e deixa-se atravessar pela linguagem, viagem na qual, através do próprio trilhamento, um autor se constitua, nos percalços desta teia-aranha, ao se arranhar na castração e ao procurar a sublime-ação de tecer e destecer a própria escrita, a própria história, de enxugar inundações, cortar por atalhos, encurtar caminhos, desinvestir ideais, desvestir fantasias, criando uma nova relação com a linguagem, uma nova rearticulação simbólica do sujeito diante do Real.

(...)

A arte [ ] reluzirá sempre o esplendor do objeto perdido e ocultará o seu mistério indevassável, mítico, e resistirá num casulo, num núcleo inacessível a quaisquer interpretações de sentido e, espero, a qualquer tentativa de devastação por parte do próprio homem, seu criador.

Ela impulsionará, silenciosa, o arco e flecha de Eros, a fisgar e enlaçar humanos, erótica e afetivamente, criando vínculos sociais, civilizatórios e éticos.
Se exibe, despida sob véus, para ser usufruída, fruída em seu charme e fascínio encantatórios, sem nunca se tornar totalmente compreendida, explicada ou devassada.

E quanto à chave da criação poética, segredo revelado a alguns mortais ungidos pela Graça Divina, esta foi achada por Drummond durante sua “Procura da poesia”, no exato momento em que o poeta nos pergunta:

Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?" 

*            *            *

Marília Brandão Lemos Morais
Psicanalista do Círculo Psicanalítico de Minas Gerais.
Médica Psiquiatra.
Autora do livro de poemas Resíduos,  publicado em 2004 pela Editora B.

Nenhum comentário:

Postar um comentário