O inimaginável
Luís Fernando Veríssimo - 'O Globo', 29 de março 2015
Minha sugestão é: vamos pensar no universo e esquecer todo o resto?
Já se chamou isto de “pensar nas últimas coisas”, mas o problema é que os cientistas ainda não chegaram a um acordo a respeito das primeiras coisas.
Teorias sobre o começo do mundo continuam a ser só isso, teorias.
Até algumas que pareciam ser universalmente, sem trocadilho, aceitas continuam em discussão, como a teoria do Big Bang, que teria criado tudo em segundos.
Agora, estão dizendo que não houve o grande pum.
Especulações sobre o que existia antes da explosão inaugural — era o nada absoluto ou não era nem o nada? — devem ser substituídas por uma questão ainda mais estonteante, pois se as novas especulações (provocadas, se entendi bem, pela descoberta de pequenos buracos negros indicando a existência de universos paralelos) estiverem certas, significará que o universo, ou a versão do universo que você e eu habitamos, nunca começou. Sempre existiu!
A mente humana não está capacitada a entender uma coisa que existe sem nunca ter começado.
O conceito do infinito para os dois lados é demais para quem está acostumado a uma vidinha orgânica, em que tudo nasce, cresce, declina e, que remédio?, acaba.
O infinito para a frente ainda é, com algum esforço, concebível. O infinito para trás não cabe na nossa cabeça.
Cientistas, e principalmente, físicos, são um pouco como bombeiros, policiais, desmontadores de bombas e domadores de circo, habituados a enfrentar situações extremas que espantam os outros.
Vão aonde ninguém mais vai.
No caso dos físicos, até as bordas do conhecimento, sem medo de serem engolidos pelo inimaginável, como um leigo.
Mas duvido que em algum ponto das especulações eles não lamentem os limites naturais mesmo de uma mente privilegiada, e concluam que nenhuma teoria, jamais, chegará perto da verdade sobre a origem da matéria.
Eu já estou com saudade do Big Bang.
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